segunda-feira, 14 de julho de 2008

Futebol - A'rte'm torcer

(Breve histórico de um ex-torcedor)

Quando era pequeno eu torcia para o Ceará. Para o Ceará e para o São Paulo. Eu era um torcedorzinho fanático. Tinha camisa do São Paulo, número sei lá qual, e frequentava os estádios nos jogos do Ceará. Estive inclusive num dos jogos de maior público do estádio Castelão, Ceará X Grêmio, final da Copa do Brasil de 1994.

Meu irmão torcia para o Palmeiras. Tenho certa lembrança da final do Brasileirão de 1994. Lembro da taça. Pesquisando aqui, vejo que a final foi contra o Corinthians. Palmeiras campeão. Assistimos a esse jogo. Não lembro onde estava minha paixão pelo São Paulo. Tornei-me Palmeirense.

Não sei como se deu esta mudança, mas meu irmão passou a torcer para o Corinthians. Não deu outra, acompanhei. Tornei-me Corinthiano.

Era eu um legítimo alvinegro então. Ceará e Corinthians.

Não sei como ou quando, deixei de acompanhar as pelejas locais. Apaulistanei-me. Só Corinthians me apetecia.

E como apetecia.

Mas deixou de apetecer. Acompanhei como fiel torcedor sua trajetória só até os idos de 2000, ano do controverso título mundial. A campanha de vice-campeonato no Brasileirão, contra o Santos, eu até vi mais ou menos, em 2002.

Em 2004, tive uma recaída e acompanhei com afinco a trajetória ao título paulista. Até ganhei 5 reais numa aposta contra um amigo são-paulino.

Em 2005, passei a dizer-me torcedor do Fortaleza, mas só por conta do retorno à série A e deixava isso bem claro. A intenção era de, de certa forma, "apoiar" (embora quem de fato faça isso seja quem torce período integral, seja na boa ou má fase) o futebol local. Valorizar a conquista. Mas nunca acompanhei deveras.

***

(Saudosimos)

Sinto falta da paixão cega de quem torce. Sinto falta de defender a todo custo essa paixão. Sinto falta da angústia da derrota, do empate apertado, da vitória difícil. E sinto falta de preferir não sentir essa angústia, de torcer pela vitória fácil, querer sempre goleada.

Vez e outra, engano-me com uma pontinha do sabor.

Sinto falta de ser torcedor deveras.

***

(Fatos)

Dizia-me corinthiano mas torci por sua queda à segunda divisão. Só pelo inusitado da situação.

Apaixonado pelo Ceará quando pirralho, eu vibrei com a subida do Fortaleza. Idem.

Ensaio até hoje dizer-me torcedor do Ferroviário. Só por causa do que certa vez li escrito por Falcão (esse não, esse) na orelha de um livro sobre o time. Não lembro bem, mas era algo sobre a famosa formação tática de "ataque em xis e defesa em zigue-zague". Tudo pelo inusitado.

Acho que gosto mesmo é de teimar.

(Ou, para manter a entoada, "gosto mesmo é de teimar deveras".)

***

(Porque violência também é arte)

Ouvi de um professor de história meu certa vez que "muito ganharia o Brasil se extinguissem os estádios, as igrejas e a televisão". O comentário tem lá sua graça e faz lá sua crítica, mas, convenhamos, é tão tendeciosamente polêmico quanto absurdo. Não falo pelos aspectos religioso e televisivo (essa série de textos chama-se "Futebol"), embora pudesse; discordo da frase inteira.

Não tenho certeza, mas creio que o professor até fez uso de um dos mais imediatos dos trocadilhos, "Torcida Des-organizada". E falou de violência, brigas dentro e fora dos estádios, do ódio cego e imbecil que alimentam torcidas rivais, mortes, tragédias. A platéia pueril concordamos quase que totalmente em tudo que nos era lecionado. Anotamos no caderno, logo abaixo do título "Feudalismo", "muito ganharia o Brasil se...". Brinco, nada foi anotado. (Isso me lembra daqueles que pregam que nosso país não é sério, porque "onde já se viu uma nação parar por uma semana inteira em feriado?", mas morrem de beber e fazer tudo quanto é marmota durante todo o "vergonhoso" carnaval.)

O raciocínio do catedrático peca pela pressa, por interferência do gosto pessoal e por espontânea vontade (ele bem quis fazer polêmica só pelo sabor de defender uma causa absurda). Pois, alegando motivação semelhante, pode-se defender a proibição do uso de automóveis. Pode-se proibir o cigarro (olha só...), as bebidas alcoólicas (não!) e, com um pouco de catimba, legalizar a maconha. Pois o Brasil muito teria a ganhar se anulados fossem os acidentes de trânsito, os malefícios do tabaco e do álcool, e se permitido fosse fazer uso das propriedades psico-terapêuticas da erva... Com argumentos absurdos chega-se a qualquer lugar. "Dá-me um ponto de apoio, que erguerei o mundo!"(definitivamente, não sou bom com dizeres...).

Os criminosos também amam. Os criminosos também choram. Os criminosos também torcem para times de futebol. E choram, porque torcem para times de futebol; torcem para times de futebol, porque amam; amam, porque choram. Ou é tudo ao contrário; sei lá quem é quem nessas causas-e-efeitos. Os maus-caracteres também têm a benção do livre-arbítrio. Por isso torcem; por isso podem vir a se tornarem criminosos.

A violência nos estádios se deve aos maus-caracteres das arquibancadas da vida.

Podem então indagar quanto aos jovens torcedores de boas famílias, com bons históricos escolares em boas escolas que, fisgados pelo temeroso nevoeiro do qual se munia com estatísticas meu professor, explodem bombas, jogam pedras, disparam tiros e matam. Entristece-me também. Digo apenas que tais acontecimentos não se dão por culpa dos estádios (ou da religião, ou da televisão...), logo não seria cabível estingui-los por busca de uma solução.

E digo: numa sociedade de praticável utopia, as cadeias seriam igualmente abarrotadas como hoje elas são. Pois ainda se mataria por amor, por ciúme, por ódio, por paixão. Ainda se roubaria por inveja, por ganância. Todos são sentimentos sinceros e naturais do homem. Escapar disso é morrer.

Conecto e adapto dois trechos para resumir em conclusão. A culpa não é dos estádios, palcos do mundo; a culpa é dos maus-caracteres das arquibancadas da vida.

6 comentários:

Unknown disse...

"Sinto falta da paixão cega de quem torce. Sinto falta de defender a todo custo essa paixão. Sinto falta da angústia da derrota, do empate apertado, da vitória difícil. E sinto falta de preferir não sentir essa angústia, de torcer pela vitória fácil, querer sempre goleada.

Vez e outra, engano-me com uma pontinha do sabor.

Sinto falta de ser torcedor deveras."

Que o que mah...eu todo dia me pergunto pra que diabos eu fui inventar de gostar de futebol. A balança sempre pesa mais para a tristeza da derrota que para a alegria da vitória.

Anônimo disse...

se a sua balança pesa pra tristeza deve ser pq vc eh corinthiano ou flamenguista... ;)

th. disse...

Anônimo bonitão não dá a cara a tapa, mas toca no calo. Se for torcedor do Ceará, mal sabe que raf é leão vermelho. Vermelho, acuado, entristecido...

Ainda bem que sou ferrim!

Unknown disse...

é mah, teu scrap talvez tivesse certo

th. disse...

Que é isso rafa, a poesia e a amizade prevalecem. Confessa, já fizeste coisa pior, e ainda nos amamos deveras.

Nota: O post foi editado. Cresceu em uma frase ou duas no texto "Porque violência é arte". E, pasmem, o plural de 'mau-caráter' é 'maus-caracteres'! Isso mesmo, Asterisco Rebelde e sua gangue têm agora um nome super legal e transado para o grupo.

Anônimo disse...

eh PT, pelo jeito quando tu era pequeno tu so era fiel mesmo ao teu irmao.. Como tu mudou te time rpz! e ainda hj mudaa! Mas como diria Raulzito, "eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opiniao formada sobre tudo..".
Quanto a frase do professor de historia (faço até idéia de quem seja.. =]) acho uma tremenda hipocrisia. Estadios, igrejas e televisao sao apenas manifestações das necessidades humanas de lazer e aceitação. Sao os momentos onde o homem inconscientemente esquece da sua racionalidade e muitas vezes extravaza sentimentos contraidos de raiva, alegria e serenidade. Destruir essas instituição nao vai destruir a natureza humana, que logo encontraria outro escoadouro. eh PTzito, vc tem razao