quarta-feira, 18 de junho de 2008

Questões métricas

Numa antiga troca de recados com um velho amigo, lembro que brinquei desgraçando um pouco os versos de Pessoa. Andava meio desesperançoso, daí escrevi: "Tudo valer a pena quando a alma não é pequena é balela. Da mesma forma que o coração é aproximadamente do tamanho de um punho fechado, a alma é exatamente do tamanho de dois punhos fechados na vertical, um em cima do outro. Não sei onde que ela fica, mas cabe numa lata de Pringles". A resposta que recebi dizia algo como "deixe as questões métricas de lado e faça o que você acha que é certo". Sábio Mário Helder.

Mais recentemente, conversando com o Caio (do o Ocaiocaiu), veio-me outra com a mesma entoada: "Tudo vale a pena quando a alma não é pequena, e a minha é das que vem no casco maior, 600 ml". Muito prontamente, ele rebateu: "só tem que retornar após o uso, foda isso". É um fela... Fantástico.

***

(Isso seria um outro post, de nome "Questões métricas II" ou "Uma carta para ninguém".)

O amor não é maior que a vida mas é pau a pau. Então, se um amor é deixado de lado com o pretexto de viver, meu caro, é bom que se viva sem olhar para trás (ou só olhar pode? Se sem maiores ponderações, talvez).

Para os já iniciados na arte de seguir adiante (ou "let it go", "move on", "bola pra frente"), o que escrevi acima pode parecer demasiadamente piegas (quase tão piegas quanto a palavra piegas), mas me é sincero e verdadeiro.

Legal pensar o jeito que fica ao contrário: a vida não é menor que o amor, mas é pau a pau. Então, se o viver é deixado de lado com o pretexto de amar, é bom que se ame sem olhar para frente. Bizarro. Ou seria "é bom que se ame olhando para frente"?

Deixa pra lá, pra frente agora só a bola.

Com amor,
th.

Um comentário:

raquelholanda disse...

Achei muito bonitinho a desconstrução do texto de Pessoa, e ainda mais, “Uma carta para ninguém” ou “Questões métricas II”, pela reflexão sobre o amor e toda a inversão de contextos e valores.

Isso me lembrou as palavras de Drummond:
“O amor é grande e cabe
nesta janela sobre o mar,
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe,
no breve espaço de beijar.”

E assim, só para complementar a sua idéia: viver é se arriscar a todo instante, amar também é se arriscar. Imagine viver sem um amor, que graça tem?! Amar é viver encarando os perigos impostos pelas crenças do coração - o melhor de tudo é saber que vale a pena.

Abc.