quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Dialogam

A pele dela que me disse, estava com frio. não a conhecia, não a conheço, mas muito bem eu sabia que estava. A pele dizia. e eu bem sabia, porque via. via seus pelos eriçados, os poros sobressaltados; Seu corpo dialogava com o meu olhar. e eu via o frio que ela sentia. não que eu a tenha tocado ou sentido do frio e presumido que estivéssemos ambos a sentir. eu simplesmente vi.

***


Caminhava apressado quase. À direita a praça, à esquerda o comércio, o banco num prédio alto à frente - pessoas, esquinas, caminhos. Um cheiro. Respirava sem compasso, o cheiro me arrebatou; agarrei-lhe num longo e pleno inspirar. Caminhei ainda um, dois, lentos, três passos antes de abrir os olhos - fecharam-se como que a procura de imagens na mente, dentro. Vivo algo senti. Cores, vozes, tudo o que me veio, o cheiro que trouxe. Procuro fora, prédios, esquinas, fétidos e fétidas e cheiro nenhum. Pessoas, caminhos. De novo lembro. Sigo. Entorpecido. Quase.

***


Precisava proteger os ouvidos. Papeizinhos, perfeito. Mas sujos e riscados, exigiria certo sacrifício. Devidamente amassados: boca. Amargo. E muito salivei. Tão ruim quanto mastigá-los e lhes sentir o sabor era saber que teria de engolir a papa que restasse. O pior passado, imprenso aos orifícios essas gomas e me escorrem nos dedos excessos de saliva. Não querendo enxugar nas roupas, decido por dar-lhes o destino nativo e: mãos aos lábios - com a língua, paradoxo, secá-las-ia. Fluida brincadeira, calça-me luvas o odor, o odor!? - resgata-se viva em mim a sensação de um beijo teu. (Ouvidos tapados, o intenso barulho soa longínquo e o silêncio me encapsula.) É odor este o mesmo daquele que me persistia na pele, na face, no corpo, onde tu osculasse? Sim, é. Mas a baba minha...? Porque em teus beijos, percebo, lambuzava-me de mim, comigo; e teu hálito, em verdade, emprestava-se do meu.

***


sei do teu sorriso quando ouço o chiado de um leve soprar entredentes. (há muito não te vejo, mas bem sei dos teus olhos, tua boca, bochechas e todo o resto quando em gargalhada estás desfeita - refeita - perfeita). ao telefone, podia ouvir e lembrar. agora, lembro do que ouvia, só daí lembro deveras. não sinto tua falta, porque estás comigo na lembrança - mas mais distante a cada vez. em não muito tempo, estarei vendo o que me lembra do que ouvi quando em teu toque em meus lábios um perfume....

Sinto tua falta.

Um comentário:

raquelholanda disse...

Adoro todos, a pele e o frio; o cheiro e a andança; a língua e a saliva, e por ultimo, a saudade.
Dialogam as palavras entre si, os contextos.

"Porque em teus beijos, percebo, lambuzava-me de mim, comigo; e teu hálito, em verdade, emprestava-se do meu."

"... bem sei dos teus olhos, tua boca, bochechas e todo o resto quando em gargalhada estás desfeita - refeita - perfeita"

Lindo isso, viu?!